Jair Bolsonaro Foto: Reprodução |
Nas eleições de 2018, Luiz Inácio Lula da Silva, impedido de concorrer devido à Lei da Ficha Limpa e cumprindo pena em Curitiba, oficializou sua candidatura à Presidência. Apesar das escassas perspectivas de sucesso, o líder petista persistiu na disputa, mantendo seu nome na corrida até ser excluído pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a menos de quarenta dias do primeiro turno. A estratégia quase obteve êxito, pois Lula conseguiu transferir uma considerável parcela de votos para seu vice, Fernando Haddad, que avançou para o segundo turno.
Oito anos depois, uma narrativa semelhante pode se desenhar, desta vez envolvendo o vencedor daquela eleição, Jair Bolsonaro. Também inelegível, o presidente atual sinaliza que levará a discussão acerca de sua candidatura até 2026. Esse cenário potencialmente impactará não apenas o processo eleitoral, mas todo o panorama político do país.
A principal estratégia para recuperar o direito eleitoral é através do judiciário. Condenado pelo TSE, ele apela ao STF contestando a decisão sobre o uso do Palácio do Planalto. Sua equipe jurídica, liderada por Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, ex-ministro do TSE, é financiada pelo PL, partido com forte interesse em disputar a candidatura nos tribunais.
Na fase inicial da estratégia, a sorte parece não favorecer Bolsonaro. O ministro designado, Cristiano Zanin, ex-advogado de Lula, levanta a possibilidade de suspeição. Caso isso não ocorra, as perspectivas para Bolsonaro são limitadas, já que Zanin é conhecido por decisões rigorosas nesse tipo de processo. Mesmo que o voto seja submetido à Primeira Turma e, se necessário, ao plenário do STF, a probabilidade de sucesso de Bolsonaro permanece baixa, dada a taxa de provimento de recursos de apenas 4,6% no ano anterior, segundo Walber Agra, advogado do PDT.
A defesa não busca acelerar os julgamentos de Bolsonaro no STF, pois enquanto não houver trânsito em julgado, ele pode lançar uma candidatura sub judice, semelhante à de Lula em 2018. O pedido de registro no TSE resultará em um processo judicial, cuja decisão ocorrerá próximo ao primeiro turno. Durante esse período, Bolsonaro desfrutará das prerrogativas dos candidatos. A presidência de Kassio Nunes Marques no TSE em 2026, indicado por Bolsonaro, pode favorecê-lo, permitindo liminares enquanto recursos estão em tramitação.
Apesar da possibilidade de insucesso, uma candidatura sub judice pode proporcionar ganhos políticos. O principal objetivo é aproveitar a popularidade de Bolsonaro como candidato, e em caso de contratempos judiciais, transferir os votos para o vice, constituindo o "plano A". Nesse cenário, é crucial avaliar o potencial de transferência de eleitores do ex-presidente, influenciado pelo vínculo do vice com Bolsonaro. Haddad, que rapidamente herdou votos de Lula, foi exceção, pois a média de transposição é cerca de 30%. O ex-presidente mantém um alto potencial eleitoral, conforme pesquisa do Datafolha em dezembro, indicando que 91% dos eleitores de Bolsonaro em 2022 não se arrependem e 82% mantêm ou aumentaram a confiança nele em relação à eleição passada.
Embora 2018 possa não ser replicado, a estratégia pode beneficiar o bolsonarismo e o PL. A perspectiva de retorno ao poder, mesmo que remota, preserva o capital político de Bolsonaro, sua habilidade de angariar aliados e influência na eleição de correligionários. Com Bolsonaro em campanha, a polarização com o PT, presente nas últimas duas eleições, persistirá, favorecendo o bolsonarismo.
Se concorrer em 2026, ele diminuirá consideravelmente o espaço para candidaturas como as de Tarcísio de Freitas (SP), Romeu Zema (MG), Ratinho Junior (PR) e Ronaldo Caiado (GO), além da senadora Tereza Cristina (MS), todos já mencionados como potenciais candidatos presidenciais.
O perigo para esse grupo é enfrentar um fracasso eleitoral ao tentar se distanciar do ex-presidente caso ele se candidate. Em 2018, a aspiração de Ciro Gomes enfraqueceu após a intervenção de Lula, que, mesmo na prisão, conquistou partidos esperados pelo pedetista. "Além disso, enquanto for candidato, Bolsonaro continuará a receber votos anti-Lula", destaca Murilo Hidalgo, diretor do instituto Paraná Pesquisas.
Nas últimas semanas, Bolsonaro evidenciou seu desejo de retornar à Presidência. Viajando pelo país em eventos com pré-candidatos e encontros públicos, ele destaca feitos de sua gestão, comparações com o governo Lula e compartilha vídeos e fotos com eleitores em diversas cidades. Entre aliados próximos, todos o consideram como candidato único. "Não passa na cabeça de nenhum de nós uma segunda opção. Não tem outro nome", afirma o ex-ministro do Turismo Gilson Machado Neto. "O horizonte mais próximo é 2026. A força do presidente Bolsonaro no Brasil é indiscutível", destaca Altineu Côrtes (PL-RJ), líder do partido na Câmara.
O PL, particularmente, busca prolongar essa dinâmica, contando com o prestígio de Bolsonaro para impulsionar seus candidatos no Senado e na Câmara, visando repetir o êxito de 2022, quando conquistou a maior bancada de deputados (99) e oito das 27 cadeiras em disputa no Senado. Além disso, nenhum dos outros presidenciáveis especulados até agora pertence ao PL. O presidente do partido, Valdemar Costa Neto, mantém otimismo quanto à possível reversão da inelegibilidade, destacando que as mudanças políticas no Brasil são imprevisíveis. "Temos quase certeza de que Bolsonaro será candidato", afirma.
Para o líder do partido, mesmo em caso de prisão do ex-presidente, decorrente das investigações em curso (como incitação ao 8 de Janeiro, venda de joias da Presidência e ataques às urnas), o plano de tê-lo na disputa permanecerá. Ele sustenta que o ex-presidente poderia se tornar um mártir, vítima de um alegado autoritarismo judicial. O líder destaca que a melhora da popularidade já ocorreu quando o ex-presidente foi julgado inelegível. "Imagine se ele for preso então. Vão levar Bolsonaro para o céu", expressa. "Pessoalmente, seria uma tragédia para Bolsonaro. Eleitoralmente, seria muito positivo", conclui Murilo Hidalgo.
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