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O Supremo Tribunal Federal (STF) acaba de determinar que a imprensa pode ser responsabilizada pelas declarações de entrevistados, marcando um passo significativo na restrição da liberdade de expressão no país e na alteração da jurisprudência liberal que prevaleceu por algum tempo. Essa decisão equipara, essencialmente, a responsabilidade da imprensa pelo conteúdo divulgado por seus entrevistados à responsabilidade das redes sociais pelo material publicado por seus usuários, um desejo compartilhado por muitos ministros e parlamentares. O caso em questão envolveu um artigo publicado pelo Diário de Pernambuco em 1995, no qual um entrevistado acusava um político de cometer um crime durante a ditadura militar em 1966. O político buscava indenização não apenas do acusador, mas também do jornal.
Apesar de já existir uma maioria favorável à punição, faltava estabelecer uma tese que pudesse ser aplicada em casos futuros. Os ministros do STF combinaram os argumentos apresentados por Alexandre de Moraes e Luis Roberto Barroso, resultando na determinação de que a responsabilização ocorrerá em casos de "informações comprovadamente injuriosas, difamantes, caluniosas, mentirosas", desde que duas condições sejam atendidas: primeiro, que na época da divulgação havia indícios concretos da falsidade da acusação; e segundo, que o veículo não tenha observado o dever de cuidado na verificação da veracidade dos fatos e na divulgação da existência de tais indícios.
O STF, em junho deste ano, compilou sua jurisprudência sobre liberdade de expressão em um livro que abrange os julgamentos considerados mais relevantes no período de 2007 a 2022. No entanto, a decisão atual tornou esse livro obsoleto em menos de seis meses após o lançamento. Destaca-se que a primeira decisão transcrita no livro, referente à Ação Penal 1.444, resultou na prisão do ex-deputado federal Daniel Silveira em 2022, indicando desde então a intenção dos ministros de estabelecer limites para a liberdade de expressão.
Os ministros, ao decidirem sobre o caso, modificaram a lógica estabelecida em decisões anteriores, tornando a imprensa passível de processos simplesmente por veicular declarações de terceiros. Mesmo com as condições estabelecidas e a possibilidade de não haver condenações, a ampliação do risco jurídico por si só representa um ônus capaz de inibir a publicação de reportagens que denunciam crimes ou revelam esquemas que demandam uma apuração mais detalhada. Além disso, a corte tornou a imprensa sujeita a punições por atos não dolosos, ou seja, por publicações que não possuem um propósito malicioso de difamar alguém.
A decisão do STF inevitavelmente cria um efeito inibidor na liberdade de imprensa, conforme destacado pelo ministro Ayres Britto, ou o "chilling effect" mencionado pelos americanos. Entrevistas como a de Pedro Collor, que contribuíram para o impeachment de seu irmão Fernando Collor no início dos anos 90, provavelmente enfrentariam dificuldades em serem publicadas caso uma decisão como essa estivesse em vigor na época.
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